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A Polêmica sobre os Alimentos Transgênicos
Em 1778, um cientista inglês chamado Edward Jenner foi duramente criticado pela sociedade e pela comunidade científica de sua época por causa de sua nova descoberta. Passaram-se sessenta anos até que a vacina contra a varíola tivesse maior aceitação popular. Hoje a varíola não é mais uma ameaça porque foi banida da face da Terra graças à vacina de Jenner. O brasileiro Oswaldo Cruz passou por situação semelhante quando iniciou a campanha contra a febre amarela no início do século, encontrando uma grande resistência contra a vacinação, uma tecnologia desconhecida dos brasileiros de então. Houve até um movimento popular para impedir a vacinação que ficou conhecido como a "Revolta da Vacina". Mas a história foi esquecida e paradoxalmente, com o ressurgimento da febre amarela, em sua versão silvestre, o movimento nos postos de saúde tem aumentado bastante por causa de pessoas que procuram se vacinar. A introdução dos alimentos transgênicos no mercado brasileiro tem provocado um acalorado debate na sociedade. A tecnologia dos transgênicos, possível graças aos avanços da Engenharia Genética a partir da década de 70, provoca medo e insegurança porque traz para a nossa vida cotidiana, um novo paradigma científico - a manipulação do DNA. É na molécula de DNA que está contida a base primária da vida, ou seja, as instruções que comandam todas as funções das células. .
Os primeiros experimentos genéticos foram realizados em 1860 pelo monge austríaco Gregor Mendel. Ele promovia o cruzamento de tipos diversos de ervilhas e observava como as características de cada planta eram herdadas pelas gerações seguintes. Embora Mendel não tenha nem chegado perto do DNA, seus trabalhos foram cruciais para o desenvolvimento de uma nova área da biologia; e muito embora o mundo científico só tenha reconhecido isso muitos anos após a sua morte, seus trabalhos com ervilhas alicerçaram o que hoje conhecemos como Biotecnologia. Em 1962, o americano James Watson e o inglês Francis Crick receberam o Prêmio Nobel de Medicina pela descoberta da molécula de DNA. Watson chegou a preconizar que "os mistérios da vida estarão sob o controle das futuras gerações - dependendo da rapidez com que os segredos do DNA forem elucidados". Quarenta anos depois, Watson e Crick estão vivos para ver como a ciência avançou nessa área, manipulando genes, transferindo-os de uma espécie para outra e até clonando animais inteiros, como a ovelha Dolly.
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Bactérias
transgênicas
As técnicas de clonagem molecular
já vem sendo usadas comercialmente há vários anos.
A primeira aplicação comercial ocorreu com a produção
de insulina humana para o tratamento do diabetes. Antigamente os diabéticos
utilizavam insulina de origem suína, o que podia provocar reações
de rejeição pelo organismo porque a insulina humana e a suína
são muito parecidas mas não exatamente iguais. Atualmente,
a insulina para diabéticos é fabricada por bactérias.
O gene que produz a insulina humana foi clonado, ou seja, isolado e transferido
para uma bactéria. As bactérias crescem e se multiplicam
em tanques de fermentação, produzindo insulina humana em
grandes quantidades.
Transgênicos na mesa Mas talvez seja na agricultura que a Biotecnologia está sendo mais utilizada. Na agricultura, as espécies vegetais são cultivadas em condições que estão muito longe do que se poderia chamar de 'natural'. Decorre disso que entre os problemas mais comumente enfrentados está o ataque de pragas e insetos, que encontram nos campos agrícolas a ausência de predadores e abundância de alimento. Através de técnicas de melhoramento genético (cruzamento de variedades de plantas, algo parecido com o que Mendel fazia) a agricultura já evoluiu muito e conseguiu selecionar espécies mais resistentes e mais produtivas. Mas ainda assim, atualmente se gasta muito em herbicidas e inseticidas nas lavouras, produtos na maioria das vezes tóxicos e cujos resíduos permanecem nos alimentos que estamos consumindo diariamente. A polêmica sobre os transgênicos se tornou intensa depois que a indústria agrícola começou a utilizar técnicas de biologia molecular, introduzindo ou eliminando genes, para produzir plantas mais resistentes às pragas e aos insetos. Essas plantas fazem parte de nossa dieta alimentar (como a soja, o milho, a cana-de-açúcar etc). Em outras palavras, o problema chegou até o nosso prato de comida e isso levanta uma série de questões éticas e de possibilidades de riscos à saúde do consumidor e ao meio ambiente, já que esses alimentos são um construto humano, não ocorrendo de forma espontânea no natureza. Se por um lado não há muitas evidências dos malefícios que os transgênicos podem trazer à saúde e ao ambiente, por outro, considera-se que essas questões não tenham sido exaustivamente estudadas até então. Pode ser que os alimentos transgênicos sejam completamente inócuos, mas para saber será preciso testá-los. Pode ser que daqui há muitos anos nos lembremos dos transgênicos da mesma maneira como lembramos hoje das vacinas de Jenner e Oswaldo Cruz. Mas apesar de pouco provável, nada nos garante que a história seja outra, talvez mais parecida com àquela da talidomida ou da energia nuclear, que pelos danos que causaram, tornaram-se inesquecíveis.
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A
Situação no Mundo e no Brasil
Os campos agrícolas de experimentos com transgênicos já existem desde 1986. Até 1997, cerca de 25.000 experimentos foram conduzidos em 45 países (o Brasil não consta nessa lista). A partir de 1997, a liberação de pelo menos 48 transgênicos para comercialização foi autorizada nos EUA, China, Canadá, Austrália e México. No Brasil, a polêmica começou depois que a Monsanto (uma grande empresa multinacional do ramo de sementes) decidiu colocar no mercado brasileiro o seu novo produto, uma semente de soja transgênica (Roundup Ready), na qual foi incorporado um gene que lhe confere resistência ao herbicida utilizado na lavoura (glifosate). Os herbicidas são utilizados para atacar as ervas daninhas que comprometem o desenvolvimento da planta, entretanto acabam por prejudicar a própria planta, no caso a soja. Com uma nova soja resistente ao herbicida, esse problema não existe e a produção pode aumentar. Para a regulamentação desse novo produto no mercado agrícola, o governo brasileiro criou, através de um decreto em 1995, uma Comissão Técnica Nacional de Biossegurança, a CTNBio. A CTNBio é formada por representantes do Ministério da Ciência e Tecnologia, Saúde, Agricultura, Meio Ambiente, das Relações Exteriores, Orgãos de Defesa do Consumidor, Orgãos da Saúde do Trabalhador e do Setor Empresarial de Biotecnologia. A função da CTNBio é a de se manifestar sobre a biossegurança e seu parecer é apreciado pelos orgão dos governo que podem ou não conferir a autorização final. Ao analisar o pedido de uso em escala comercial da soja Roundup Ready da Monsanto e após examinar exaustivamente uma grande quantidade de resultados de pesquisas nacionais e internacionais, a CTNBio elaborou um parecer técnico conclusivo de que não há evidências de risco ambiental ou de risco à saúde humana ou animal decorrentes do uso da soja geneticamente modificada. Mas estabeleceu como precaução adicional que os plantios comerciais devem ser monitorados por 5 anos, analisando eventuais ocorrências, embora não previsíveis. Apesar do parecer favorável, a CTNBio ainda não normatizou completamente esse tema, pois ainda falta estabelecer regras sobre segurança alimentar, rotulagem e comercialização. A oposição aos transgênicos, entre os quais estão o Instituto de Defesa do Consumidor (Idec), argumenta que essa pressa pela regulamentação é injustificável e fere direitos básicos previstos pelo Código de Defesa do Consumidor. O plantio em escala comercial da soja Roundup Ready foi autorizado em maio de 1999 pelo Serviço Nacional de Registro de Cultivares. O Idec, ao qual veio se juntar posteriormente o Greenpace e o IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) entraram com uma medida cautelar na Justiça Federal alegando que a CTNBio deve exigir o Relátório de Impacto Ambiental e elaborar as normas sobre segurança alimentar e rotulagem. Em agosto de 1999, a justiça sentenciou favoravelmente à ação do Idec. O juiz ainda intimou os ministérios da Agricultura, Ciência e Tecnologia, Meio Ambiente e Saúde a não expedirem qualquer autorização antes de serem cumpridas as determinações judiciais. Enquanto o caso da soja Roundup Ready tramita na justiça, outras empresas solicitam pedidos de liberação à CTNBio. Existem atualmente 1 pedido de liberação comercial (do milho transgênico resistente a lagartas, da Monsanto) e 25 pedidos de liberação planejada (ou seja para experimentos) de diversas empresas nacionais e transnacionais, como a Pionner Seeds (milho), a Novartis (milho), Hoescht Schering (arroz), Agroceres (milho), Monsanto (milho e soja) e Embrapa (soja e mamão). O texto das solicitações está disponível na página da CTNBio (http://www.mct.gov.br/ctnbiotec/lib_ogms.htm) e qualquer pessoa pode manisfestar sua opinião (desde que justificadas) sobre esses processos em andamento.
Riscos à saúde ? Teoricamente existem alguns riscos como
a possibilidade do DNA inserido no alimento ser tóxico. É
possível também que o produto do DNA inserido (uma proteína)
possa causar toxicidade ou reações alérgicas. Há
alguns casos relatados de respostas alérgicas em indíviduos
que consumiram um alimento transgênico que possuia um gene da castanha
do Pará. É possível ainda que o DNA inserido possa
ser transferido para os microorganismos da flora intestinal. A esse respeito
é importante ressaltar que alguns genes inseridos nas plantas conferem
resistência à antibióticos, e nesse sentido, seria
extremamente indesejável que microoganismos da flora intestinal
adquirissem esse gene e se tornassem resistente a determinadas drogas.
Segundo um estudo da Royal Society da Inglaterra, há chances de
que isso ocorra e a entidade recomenda fortemente que esses genes marcadores
de antibióticos sejam eliminados gradualmente.
Como é avaliada a segurança do alimento transgênico ? Essa avaliação é fundamentada no princípio da equivalência. Este conceito prevê que esses produtos devem apresentar inocuidade, características nutricionais idênticas ao alimento convencional e ausência de efeitos indesejáveis, para poderem ser autorizados para consumo. Avalia-se especialmente o potencial alergênico da nova proteína expressa, a termoestabilidade, a digestibilidade no meio gástrico e intestinal, análises bioquímicas de sequências de aminoácidos, toxicidade expressa pela nova proteína, efeitos secundários da inserção do gene, risco de mutagênese, ativação de genes silenciosos ou pouco expressos provocando biossíntese de metabólitos tóxicos. Segundo a CTNBio, todos esses parâmetros são levados em conta na análise de riscos. Essa avaliação é feita caso a caso e além desses parâmetros, também são considerados os pareceres técnicos emitidos pelos orgãos governamentais de outros países onde o mesmo produto já tenha sido autorizado para consumo. É importante ressaltar que em vários casos o novo gene introduzido não se encontra presente no alimento transgênico, sendo impossível detectá-lo. O óleo de soja refinado, por exemplo, não possui DNA ou proteína transgênica pois o processo de refino elimina esses componentes. O FDA (órgão que regulamenta alimentos e medicamentos nos EUA) aprovou a soja Roundup Ready por considerar que não há evidências de risco à saúde humana ou animal. Como contraponto (mas não como justificativa) vale a pena lembrar que uma série de produtos não-transgênicos à venda no mercado possuem componentes com conhecido risco para a saúde, como os alimentos ricos em gordura saturada que comprovadamente elevam o risco de doença cardíaca.
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Riscos
ao Meio Ambiente ?
Teoricamente poderia haver a criação de novas ervas daninhas resistentes aos herbicidas. É possível haver uma transferência do gene que confere resistência ao herbicida para outras espécies de plantas filogeneticamente relacionadas. Poderia haver ainda, na planta transgênica, a produção de novas substâncias que seriam tóxicas a outros organismos que se alimentam ou vivem dela. A degradação da planta poderia dar origem a substâncias secundárias tóxicas que se disseminariam no meio ambiente. Enfim, todos esses efeitos poderiam provocar um efeito pernicioso sobre os ecossistemas. Segundo alguns especialistas, no caso da soja Roudup Ready, a probabilidade do surgimento de novas pragas super resistentes é muito baixa. A soja, além de ser uma planta de que se autofecunda naturalmente - apenas 1% cruza com outra planta de soja - não possui nenhum parente silvestre no Brasil com o qual possa cruzar, o que torna altamente improvável a transferência de um gene da soja para uma planta de outra espécie. O herbicida Roundup tem sido utilizado no Brasil há mais de 20 anos sem que se tenha notado o aparecimento de qualquer erva daninha resistente. Entretanto, um estudo realizado em 1999 revelou que uma espécie de borboleta, a Danaus archippus, foi envenenada por um tipo de milho geneticamente modificado para produzir a toxina Bt, um pesticida natural. Esses resultados foram muito comentados na época e realmente fortalecem a idéia de que é necessário investigar mais a fundo o risco das plantas transgênicas para o equílibrio dos ecossistemas. Por outro lado, podem existir efeitos positivos decorrente do uso de plantas transgêncas. De acordo com a Monsanto, a utilização de uma espécie transgênica de algodão (Bollgard), resistente ao ataque de lagartas, reduziu em 1 milhão de litros a utilização de inseticidas sobre essa cultura.
O problema da rotulagem "O direito à informação e o direito de escolha, são direitos básicos e irrenunciáveis dos consumidores" - é o que diz o Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90 artigos 6, II e III, 9o e 31). O Idec vem desenvolvendo uma ampla campanha pela rotulagem dos alimentos transgênicos para assegurar esses direitos ao cidadão. Pesquisas realizadas em vários países da Europa (Dinamarca, Alemanha, Grécia, Espanha. França, Irlanda, Itália, Luxemburgo, Holanda, Áustria, Portugal, Finlândia, Suécia e Reino Unido) revelaram que a maioria da população (de 61% a 85%) gostaria que os alimentos transgênicos fossem rotulados. Nos Estados Unidos, uma pesquisa realizada pelo Departamento de Agricultura concluiu que 85% da população considera a rotulagem dos transgênicos muito importante. E uma outra pesquisa, realizada na Austrália, mostra que a maioria dos consumidores poderiam comer alimentos transgênicos, mas prefeririam que eles fossem rotulados. O artigo 31 do Código de Defesa do Consumidor estabelece que "as informações devem ser corretas, claras, precisas, ostensivas e em língua portuguesa. Devem conter as características, qualidades, quantidades, preço, garantia, prazos de validade e origem, entre outros dados, bem como riscos que apresentam à saúde e à segurança do consumidor". Mas a rotulagem não é tão fácil quanto parece e pode ser feita das mais diversas maneiras. Pode-se indicar no rótulo se o produto tem origem transgênica por exemplo ou pode-se decidir rotular apenas os produtos que não sejam substancialmente equivalentes (no caso, o óleo da soja Roundup Ready não seria rotulado, por motivos já mencionados anteriormente). É possível ainda uma rotulagem negativa, indicando que o produto não contém e não foi obtido através de organismos transgênicos. A rotulagem é uma questão
complicada e para promover uma discussão mais ampla na sociedade
o Ministério da Justiça está fazendo uma consulta
pública na Internet sobre a rotulagem dos transgênicos. Qualquer
pessoa pode enviar seu parecer e suas sugestões. O endereço
é www.mct.gov.br/ctnbiotec/consultapublica2.htm.
Um questão econômica ou política ? Mais do que uma questão de saúde
ou ambiental, a polêmica dos transgênicos envolve aspectos
econômicos que não podem ser menosprezados. Deixar de investir
nos transgênicos pode causar um atraso tecnológico para o
país, mas ao mesmo tempo pode ser uma estratégia econômica
para atingir mercados específicos que os rejeitam (como na maioria
dos países da Europa). No cenário nacional, o Rio Grande
do Sul, proibiu o plantio de transgênicos vislumbrando, entre outras
coisas, o comércio com a Europa; mas vem sofrendo vários
problemas com o comércio ilegal de sementes trasngênicas que
vêm da Argentina.
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Conferência
em Montreal
Na era da globalização e
do comércio sem fronteiras é importante que a venda de alimentos
O objetivo da conferência é
estabelecer um tratado internacional de comércio dos produtos
Esses países preferem um tratado
que permita que países recusem produtos geneticamente
O resultado desse acordo, entretanto, parece
ter beneficiado a maioria. Foi estabelecido que sejam rotulados os embarques
que "possam conter" alimentos transgênicos, embora não
Esse acordo permite aos países fechar
seus mercados a esses produtos mesmo que não
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![]() Farmacêutica modalidade Alimentos Mestre em neurociência e comportamento pela USP Jornalista Científica Pesquisadora Associada do NIB/UNICAMP Para se manter atualizado sobre a polêmica dos alimentos transgênicos, visite os seguintes endereços eletrônicos:
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